Hoje acordei para visitar o local, com o qual terei de
dialogar para criar o meu projeto de escultura. Mas acabei por me deparar com
algo que me deixou extremamente revoltado, como um voltar a infância e um
voltar ao meio onde cresci.
Hoje fui a uma
pequena aldeia mineira chamada Lousal, que é um espelho do Alentejo em que
cresci, que tem menos do que o Alentejo em que os meus pais cresceram, que tem
mais do que o Alentejo em que os próximos vão viver. Um Alentejo em coberto de
lonas brancas, com aquelas típicas folhas brancas que dizem: em manutenção. É
pena estas folhas não terem data, pois pelo tempo que muitas tem já podiam ser
consideradas relíquias. Foi assim que eu cresci, numa cidade de relíquias, uma
escola que é uma relíquia, com um cinema que é uma relíquia, museus que relíquias
são, todos com os mesmos vulgares papeis brancos a dizer: em manutenção. Eu
tenho uma vaga ideia de como eram estes sítios antes do aparecimento destes
papeis que parecem ter algo em comum com as ortigas, espalham-se e parece que
há de dar comichão arrancá-las.
Como é que possível
alguém crescer completo privado do que tem a frente dos olhos por mero egoísmo
daqueles que mandam, tenho presente na minha memoria que todos os anos desde
que sou pequeno ouço avante camarada avante, mas avante onde se todas as portas
por onde quis entrar estavam e permanecem fechadas com os mesmos papeis brancos
onde esta escrito: em manutenção. Eu não cresci numa pequena aldeia mineira. Eu
cresci numa cidade com 16 mil habitantes, que vivem a espera que estes papeis
sejam arrancados como se faz com as ervas daninhas, para se poder ver o que
esta por baixo.