Como seres culturais e sociais, partilhamos opiniões. Queremos fazer parte.
Mas, seja por falta de tempo livre, paciência ou meios1, aceitamos e reproduzimos ideias infundadas, opiniões alheias, opiniões mais ou menos prováveis1, sobre as quais nem reflectimos.
Comunicamos globalmente e difundimos globalmente conceitos não fundamentados, preconceitos.
As redes sociais, onde as notícias falsas (globalmente designadas por fake news) proliferam, são entendidas sobretudo como espaço de entretenimento e não como espaço de reflexão. O entretenimento está ligado ao desligar, ao não pensar, ao esquecimento da dor, à fuga. Nesse contexto, com a velocidade e a quantidade de informação disponível, facilmente chegamos ao Ninguém quer saber2.
Partilhamos informações falsas. Mesmo sabendo da importância da credibilidade da informação, na comunicação. Perversamente utilizando os mesmos canais que usamos para difundir conhecimento.
Deixamos que a ignorância se sobreponha ao conhecimento. Abolimos a utilidade social da linguagem para o bem geral da humanidade, pensada no Iluminismo.
O monstro a crescer2
A divulgação de noticias falsas torna-se ainda mais grave quando é deliberada, servindo para difundir informações falsas, criar rumores, influenciar. Servindo interesses ideológicos, campanhas de persuasão ou de propaganda. Pondo em causa o debate livre e informativo. Erguendo ou destruindo governos. Fragilizando a estabilidade das sociedades democráticas. Principalmente quando disseminadas por contas falsas de forma a chegar a um grande número de pessoas reais; pessoas cujos perfis estão bem definidos.
A mentira organizada3 como instrumento de manipulação social e política e que é, também, uma actividade económica muito lucrativa para as empresas das redes sociais.
Não devemos impedir a publicação de informação não validada, pois estaremos a limitar a liberdade de expressão. Seria um retrocesso e até antagónico ao sentido de uma rede global de comunicação. Embora a censura já exista porque as grandes plataformas, como o Google e o Facebook, decidem o que é ou não publicável nas suas redes.
A educação é uma forma de resistência fundamental na luta contra as noticias falsas, contra a mentira organizada3.
1. Locke, J. (1999). Ensaio sobre o Entendimento Humano (Livro III, Capítulo XI, Volume II). Lisboa : Gulbenkian.
2 . Luta Livre (2020).“Ninguém quer saber”. In Técnicas de Combate. Lisboa. Disponível em < URL: https://lutalivre.bandcamp.com/ >
3. Nascimento, C. (2020). Fake News, Mentira Organizada e Educação: Uma Reflexão a Partir do Pensamento de Hannah Arendt. Revista Docência e Cibercultura, 4(1), 243-263.