Aterra na Amadora, uma das cidades mais multiculturais do país, para viver, e trabalha em Lisboa, onde é exposto ao pior que a sociedade lisbonense tem para oferecer. Todos os seus preconceitos ensinados na terra natal, solidificam-se na paisagem de bêbados e drogados do Bairro Alto, nos bairros sociais, e nos bairros de lata visíveis de nossa casa, e onde a maior parte da população é de origem africana, como grande percentagem da Amadora. Cujos prazeres da vida, e acredito ser uma forma de se abstrair do que é ser um corpo racializado em Portugal, são as festa com música alta que afirmam a sua posição num lugar que não os quer e maltrata, o que infelizmente não deixa uma praceta inteira dormir, incluindo o meu pai.
Ele que faz gratificados todas as semanas durante a noite, às vezes dias seguidos por falta de pessoal, tendo de se levantar na mesma no dia seguinte para ir trabalhar na esquadra, onde convive com colegas igualmente cansados, e com as mesmas experiências que ele. Esta camera obscura não está só invertida, a imagem começa cada vez mais a diminuir de tamanho.
Acompanhado de anos de serviço, traumatismo craniano, luto e perda de membros seniores da família, vinho a todas as refeições, e uma de ausência de anos do consultório do médico, torna-se claro que esta consciência do meu pai está diminuir de tamanho e a afastar-se cada vez mais da visão dos outros.
Isto deixa-me dividida em quem devo meter a culpabilidade. Será na escolha profissional dele, por mais incompetente que ele fosse, que propocionou-lhe estabilidade económica e possibilidade de dinheiro extra para dar uma vida confortável aos filhos, ou a instituição e sistema que permitiu que ele e outros se tornassem polícias mesmo não sendo as pessoas mais empáticas e compreendidas da fábrica social.
E todos eles que são expostos ao pior lado da vida, sem nenhum tipo de apoio psicológico, sem a obrigação de check-ups médicos para continuar o serviço, sem as horas de sono necessárias, tornam-se assim as máquinas de opressão perfeitas para oprimir os já oprimidos, para controlar e exercer violentamente a autoridade sem que haja uma pinga de dúvida nestes agentes se que o que estão a fazer é errado. Toda a possibilidade para uma multivisão da realidade é aniquilada gradualmente com os anos.
Daí a importância para a fomentação da observação da multiplicidade desde crianças. Precisamos usar a nossa criatividade para inverter o afunilamento da consciência consequente da era das redes sociais, e assim arranjar maneira de as usar em a nosso favor e da democracia.